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sábado, 1 de abril de 2017

Mentiras, mentirinhas e mentirosos

Todo o pecado é um tipo de mentira.
(Martinho Lutero)


Retire do ser humano a capacidade de mentir, e a humanidade caminhará para a extinção. Desde que recebemos o direito de dominarmos sobre o mundo, a mentira se tornou numa ferramenta de sobrevivência e expansão, a qual temos usado com insistente frequência, e mesmo assim, o "corte" permanece afiado. 

Se perguntarmos para um indivíduo aleatório (em qualquer lugar do planeta) se ele já mentiu alguma vez na vida, só existiriam duas respostas possíveis:

A-   Ele assume que já mentiu e diz a verdade.
B-   Ele diz que nunca mentiu e está mentindo.

Não me entenda mal. Longe de mim dizer que você é um mentiroso compulsivo. Mas, a grande verdade, é que vez ou outra, sempre lançamos mão de uma mentirinha aqui, e outra acolá, para nos livramos de situações desagradáveis ou retirar o pescoço da forca social. Exagero? 

Não! Baste exercer um pouquinho a imaginação. Ou a memória. Tente se imaginar (ou recordar) as seguintes situações:

A esposa, voltando do salão de beleza, pergunta ao seu marido: - Amor, gostou do meu novo visual?

O pastor está realizando uma visita na casa do novo convertido, quando este lhe pergunta: - O café está gostoso?

O médico responsável pelo exame admissional numa empresa pergunta ao paciente: - Você sente dores nas costas?

O cobrador bate na porta: - Tem alguém em casa?

De zero a dez, qual a possibilidade de algumas respostas dadas neste questionário serem pequenas mentirinhas? Grande, não? 

Você está linda! 
Este café está delicioso! 
Nunca senti uma única dor em toda minha vida! 
Não tem ninguém em casa!

Mentir, basicamente é enganar, defraudar, falsificar. Faltar com a verdade. Mentimos para obter vantagem ou para nos esquivarmos de responsabilidades.  Para o escritor Machado de Assis, a mentira é muitas vezes, tão involuntária como a respiração. 

Não raramente, mentimos por mentir. Simplesmente, porque podemos. E no mundo moderno, com o falso “senso de segurança” que permeia as redes sociais, podemos mentir sobre quem somos, o que fazemos, o que pensamos e o que sentimos. Mentimos para impressionar. Mentirinhas inocentes e sem maldade. Mas, como já disse Willian Shakespeare, as pequenas mentiras fazem o grande mentiroso.

A mentira contada insistentemente, não se torna uma verdade. Mas, pode se tornar uma patologia. Hoje, a “mitomania”, ou compulsão por mentir, já é diagnosticada e tratada como uma doença. Ela afeta o julgamento racional. O indivíduo mente para si mesmo sobre as outras pessoas.

A mentira está no mundo desde o Éden, quando Adão e Eva se esconderam de Deus, fingindo não estar no Jardim. Caim mentiu sobre o paradeiro de seu irmão Abel. Abraão mentiu sobre seu estado civil quando chegou em Gerar (e anos depois, Isaque repetiu a mesma mentira). Sansão mentiu para Dalila e Dalila mentiu para Sansão. São muitas as mentiras registradas na Bíblia, como um parâmetro de suas consequências. Traumas e tragédias.

A mentira de Jacó despertou grande mágoa em Esaú. A mentira dos irmãos de José, o levaram a ser escravo no Egito. A mentira de Davi, causou a morte de Urias. Feridas abertas que o tempo teve imenso trabalho para cicatrizar. E a cicatriz, ainda doía muito ao ser tocada. Para o dramaturgo grego Sófocles, nenhuma mentira chega a envelhecer no tempo.

Mas, de onde provem a mentira? Qual a sua origem? 

Para espanto geral dos mentirosos, sejam ocasionais ou compulsivos (não minta para você mesmo, aceite que faz parte desta estatística), a mentira fez exame de DNA e teve a paternidade revelada. Ela é filha do diabo.

Vós tendes por pai ao diabo, e quereis satisfazer os desejos de vosso pai. Ele foi homicida desde o princípio, e não se firmou na verdade, porque não há verdade nele. Quando ele profere mentira, fala do que lhe é próprio, porque é mentiroso, e pai da mentira (João 8:44). 

Tudo fica mais claro agora. A mentira não é uma ação praticada. É uma integrante da família. O homem mentiroso se torna filho adotivo de Satanás e recebe a mentira como irmã mais velha. UAU! Se você sentiu um calafrio correr por sua espinha ao ler este parágrafo, saiba que não está sozinho. Um iceberg navega velozmente por meu dorso, neste exato momento. Nossas mentiras, grandes ou pequenas, são liminares espirituais para que o diabo se torne tutor de nossas vidas. E isso é assustador.

Exatamente por isso, a mentira nos dirige para caminhos de traumas e tragédias, já que seu pai é especialista em roubo, destruição e morte. E, se vivemos na mentira, ele se torna nosso guardião legal. Neste instante, acho prudente revisarmos as respostas daquele questionário melindroso proposto no início do texto.

Não. Volte imediatamente para o salão e peça seu dinheiro de volta.

Não. Nunca tomei um café tão horroroso em toda minha vida.

Sim. Estou sentindo dor agora, mas preciso desesperadamente deste emprego

Sim. Estou em casa. Quem não está na casa é o dinheiro que você veio buscar.

Embora pareça deselegante, precisamos começar a treinar a verdade aqui na terra, caso contrário, não sobreviveremos ao céu. Deus é verdadeiro e requer verdade. Deus é leal e requer lealdade. Deus é fiel e requer fidelidade. Há um ditado judaico que associa o homem infiel ao indivíduo mentiroso, já que ambos são fracos, ingratos e constroem castelos sem fundações. Não dá para se candidatar ao Paraíso com um curriculum destes. O RH de Deus tem critérios bem estabelecidos. Requisito número um: Verdade. Requisito numero dois: Fidelidade.

A palavra "fidelidade" vem do latim “fidelis”, e faz alusão a atitude de quem é leal, honesto, confiável e verdadeiro nos compromissos que assume, sendo constante em sua conduta. Numa definição mais pragmática, podemos dizer que a Fidelidade é uma observância rigorosa e exata da verdade, ou ainda, firmeza e lealdade.

Todas estas características estão presentes na composição do caráter divino, e é exatamente por isso que Ele não desiste de nós, seu projeto mais auspicioso. Só que Deus deseja uma reciprocidade desta relação. Por isto, Ele leva muito a sério nossas ações e palavras.

Na atmosfera habitada pelo Senhor, não existe mentira e nem engodo. Logo, a verdade predomina absoluta. Deus exige (e cobra) de nós a mais pura verdade. Entenda. Na presença de Deus a mentira simplesmente deixa de existir, e portanto, não temos a possibilidade de mentir ou omitir, até o mais escuso pensamento. O diálogo com Deus flui na estrada da verdade, pavimentada de espelhos e iluminada pelo sol. Não se esconde nada.

Porque a palavra de Deus é viva, e eficaz, e mais cortante do que qualquer espada de dois gumes, e penetra até ao ponto de dividir alma e espírito, juntas e medulas, e é apta para discernir os pensamentos e propósitos do coração. E não há criatura que não seja manifesta na sua presença; pelo contrário, todas as coisas estão descobertas e patentes aos olhos daquele a quem temos de prestar contas (Hebreus 4:12-13).

Deus jamais se engana, e portanto, não pode nos enganar também. Suas promessas são respaldadas na total certeza de que Ele tem o poder de torná-las em realidade. Não existem palavras ditas no afã do momento ou verbetes lapidados por sentimentos deturpados e sazonais. Deus é pontual e preciso, zeloso por honrar cada vírgula de sua Palavra. Assim, Ele espera que honremos nossas palavras, votos e promessas com o mesmo esmero.

Precisamos entender que Deus leva o homem muito a sério. Quando Esaú, entorpecido pelas circunstâncias, trocou sua primogenitura por um prato de lentilhas, certamente não estava considerando aquela promessa como válida. Mas, Deus estava. Como resultado, Esaú perdeu o direito de herdar as bênçãos patriarcais que lhe eram reservadas desde o nascimento (Gêneses 25:34).

Portanto, precisamos refrear nossa língua, pesar cuidadosamente nossas palavras e medir milimetricamente nossas ações diante de Deus. A fidelidade Dele é tão intensa, que elevará ao quadrado nossas ações, dando a elas uma conotação muito mais palpável do que pensamos. O que acarreta maior cobranças sobre elas.  

Na maioria das vezes, não somos capazes de corresponder a estas expectativas divinas sobre nós, pois a natureza humana ainda se inclina para o mal, com suas mentiras frequentes e desculpas esfarrapadas, que minam, e por vezes, implodem, a nossa fidelidade para com Deus.

Mas, nossa infidelidade não compromete a fidelidade de Deus, que continuará verdadeiro e leal independentemente de nossas atitudes, pois como disse Paulo em II Timóteo 2:11-13, “fiel é esta palavra: Se, pois, já morremos com ele, também com ele viveremos; se perseveramos, com ele também reinaremos; se o negarmos, também ele nos negará; se somos infiéis, ele permanece fiel; porque não pode negar-se a si mesmo.”

Nossas mentiras, mesmo aquelas que as pessoas não acreditam mais, tem o peso da “verdade” para Deus. Para Ele, a mentira não existe. Os céus não foram contaminados com esta invenção de Satanás. Se eu digo que o verde é azul, Deus tomará minha “daltonisse verbal” como sendo meu parecer definitivo sobre o assunto. E terei que responder por meu posicionamento.

Então, cuidado com as “pequenas mentiras”, pois Deus as imputará em nós por verdades. E não teremos como sustentá-las diante de seu tribunal. Lá, verde é verde. Azul é azul. E não temos a possibilidade, nem mesmo, de cogitar o contrário. Então, é sábio treinar o “sim, sim” e o “não, não” desde agora, afim de não sermos surpreendidos na eternidade (Mateus 5:37).

Assim que terminar a leitura deste texto, pegue nas mãos uma caneta e transcreva em sua agenda a frase do poeta Vigor Hugo. Depois, a leia toda vez que se sentir encurralado entre a “aspereza da verdade” e a “sutileza da mentira": 

- Mentir é maldade absoluta. Não é possível mentir pouco ou muito; quem mente, mente. A mentira é a própria face do demônio.

UHHHHHHHHH! Preciso de cobertores agora mesmo. O Polo Norte se mudou para minhas costas!

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