A esperança é
o sonho do homem acordado.
(Aristóteles)
Em 1932, Frida
Vingren (esposa do fundador da
Assembleia de Deus no Brasil, Gunnar Vingren), chegou a Alagoas para
iniciar ali um trabalho missionário. Logo após a chegada da família, Gunvor, a
filha mais nova do casal, contraiu uma grave doença e faleceu. O padre local,
proibiu que a menina fosse enterrada no cemitério da cidade, alegando que a
criança ainda era pagã. A dor encontrou a frustração. As tribulações
decorrentes deste triste evento, fragilizaram a saúde de Gunnar, que mais uma
vez, foi acometido de malária, uma doença que o flagelava constantemente.
Profundamente
abatido, ele se trancou em seu quarto, e enquanto orava com os olhos submersos
em lágrima, encontrou conforto na canção que saia da boca de sua esposa Frida.
Era uma versão tupiniquim que ela tinha feito para uma tradicional canção do
folclore sueco, e que se tornaria o hino 126 da Harpa Cristã:
Quando aqui as
flores já fenecem,
As do céu
começam a brilhar;
Quando as
esperanças desvanecem,
O aflito
crente vai orar;
Os mais belos
hinos e poesias,
Foram escritos
em tribulação,
E do céu, as
lindas melodias,
Se ouviram, na
escuridão.
Existe uma
grande diferença entre “estar” triste e “ser triste”. A vida cristã não irá nos
imunizar de dias chuvosos, segundas-feiras cinzentas, perdas insubstituíveis e
danos irreparáveis. Estamos no mundo, somos feitos de carne e osso e estamos
expostos a todo tipo de mazela existente no planeta: dores, traumas, acidentes,
enfermidades, desemprego, pobreza, angústias. Assim, inevitavelmente, teremos
que enfrentar momentos de tristeza, e ao longo de uma vida, derramaremos alguns
litros de lágrimas geradas em sofrimento.
Porém, para
aquele que tem sua fé alicerçada em Cristo Jesus, nem mesmo as maiores
tragédias experimentadas na própria pele, serão capazes de alterar sua condição
de “ser feliz”, mesmo que a tristeza nos faça algumas visitas desagradáveis. O
que difere o servo de Deus num contexto de tragédia, é exatamente a forma como
ele enxerga e convive com as adversidades, crendo e confiando na sabedoria
divina. Esta confiança é o que lhe dá condições para dimensionar um propósito
eternal em sua dor momentânea. Somente a fé irrestrita no controle de Deus
sobre nossas vidas, nos proporciona uma condição emocional equilibrada, a ponto
de sentirmos paz em meio aos conflitos, e nos alegrarmos com os motivos de
nossas tristezas. E este é o paradoxo que identifica entre milhares de pessoas,
aqueles que são de fato, verdadeiros adoradores.
Adorar a Deus
em espírito e em verdade, remonta a uma adoração atrelada a essência, e nunca a
uma condição. O verdadeiro adorador faz da sua vida uma harpa afinada, que a
cada vibração das fibras de sua existência, emite notas de louvores ao Criador,
independente de quem a esteja “tocando”. Quando somos "instrumentos",
cuja única finalidade é a adoração, se formos tocados pelas bênçãos divinas,
emitiremos sons de louvor. Porém, se formos tocados pela dor ou pela tragédia,
a melodia permanece inalterada, pois o nosso louvor não se deixa influenciar.
Ele é puro, genuíno e inalterado.
Quando nos
dedicamos a uma leitura sistemática dos Salmos, somos envolvidos por um
turbilhão de emoções e sentimentos. Se num verso o salmista está extasiado de
felicidade, em outro, sua alma está aflita e desesperada. Tudo é muito
paradoxal, mas nunca confuso. Este hinário do Velho Testamento é uma compilação
de poemas e cantos que refletem com precisão a alma humana, com seus altos e
baixos. Porém, a grande lição que retiramos do Livro de Salmos, é que cada
músico, poeta e tangedor, que ali deixou seu registro, transformou tantos seus
dias de maior felicidade, quanto suas noites de maiores tristezas, em hinos de
louvor.
Ou seja, se a
alegria é a motivação de todo adorador, as tristezas são catalizadoras de
inspiração e devoção para adoradores que se destacam da grande média. Os
adoradores paradoxais. Uma das
mais belas histórias bíblicas nos mostra com perfeição a pureza e a genuinidade
da adoração verdadeira, mesmo que a canção não tenha sido expressa através de
notas musicais. Jó não se tornou conhecido por ser um músico talentoso ou compor belíssimas composições, mas sim, por fazer de sua própria vida um hino de
louvor.
Pouco sabemos
sobre a vida do patriarca Jó. Ele morava em Uz, era casado, pai de dez filhos
que gostavam de festas, tinha por estima seus amigos e seu rebanho era superior
a 10.000 animais. Porém, a mais importante informação sobre Jó está inserida
logo no primeiro verso de sua história. Ele era íntegro, justo, temia a Deus e
se desviava do mal (Jó 1:1). O patriarca não frequentava uma igreja, e até
onde sabemos, não tinha um mentor espiritual. Mesmo assim, decidiu ser fiel ao
seu Deus e vivia sua vida cerceada de cuidados para que ela não fosse minada
pelo pecado. E isso atraiu sobre Jó o olhar invejoso do próprio Satanás.
O escritor norte-americano
Philip Yancey descreve o livro de Jó como uma grande peça de teatro, onde nós,
espectadores conhecemos o enredo e as motivações de cada personagem, e
exatamente por isso compreendemos cada reação as diversas ações desencadeadas.
Mas Jó, personagem central desta peça, está completamente no escuro, sem saber
o que acontece nos bastidores, não conseguindo compreender os muitos "porquês”
das páginas seguintes.
O ponto chave
desta história é a fidelidade de Jó. Satanás, astuto e ardiloso, argumenta com
Deus que é muito fácil ser fiel quando se vive em conforto e abastança, e
insinua que a fidelidade de Jó se deve, única e exclusivamente, ao fato que
Deus o cobria de bênçãos. Ali é estabelecido um embate épico, um duelo de
escala cósmica, cujo epicentro é a vida de um simples mortal. O inimigo sugere
que Deus tire de Jó tudo o que ele tem, e que depois seja reavaliado o nível de
sua fidelidade. Deus aceita o desafio e Satanás é autorizado a retirar de Jó
seus bens mais preciosos. Em poucas horas, seus bois, jumentos e camelos são
roubados por saqueadores, seus funcionários mais leais são cruelmente
assassinados por uma horda bárbara e suas ovelhas são dizimadas por uma
saraivada.
No mesmo dia,
enquanto seus filhos almoçavam juntos na casa do mais velho, um furacão
derrubou o edifício matando todos eles. Jó agora era um homem pobre, imerso em
dor e sofrimento, com um pesar indescritível lacerando seu coração. Porém,
mesmo na mais cruel adversidade, ele esbofeteia Satanás e se mantem fiel ao seu
Senhor, não imputando a Deus falha alguma: - Nu saí do ventre de minha mãe, e nu
tornarei para lá. O Senhor deu, e o Senhor tirou; bendito seja o nome do
Senhor (Jó 1:21).
Satanás não se
deu por vencido e alegou que a fidelidade havia se mantido pois o mais precioso
dos bens ainda estava intocável, insinuando que se a saúde de Jó fosse afetada,
sua fé também seria. Mais uma vez, Deus coloca sua própria honra nas mãos de
Jó, e permite que o inimigo atinja o patriarca com força total, ferindo-o com
úlceras purulentas da cabeça aos pés. Apodrecendo em vida, e sofrendo com a
intolerância das pessoas mais próximas, Jó se depara com o inevitável
questionamento: - Para que se manter fiel a um Deus que só lhe causa
dor e sofrimento, sem que ao mesmo uma única ofensa justifique tamanho
infortúnio?
Porém, com a
cabeça raspada e coberta de cinzas para externar toda sua dor, a atitude
surpreendente tomada por Jó, é se lançar sobre o pó e “ADORAR” ao Senhor. E o
golpe final, que derruba por terra as perniciosas ambições de Satanás está
registrado nas palavras de Jó 13:15. - Ainda que ele me mate, nele
esperarei; contudo, os meus caminhos defenderei diante dele.
Pode haver
louvor mais puro e verdadeiro do que entregar nas mãos de Deus a vida e a
morte, confiando completamente no seu julgamento?
Em sua forma
de entender os eventos, Jó acreditava piamente que todo mal que lhe atingia
vinha de Deus. Mesmo assim, sua reação é adorar o responsável por suas mazelas.
Pode existir exemplo melhor para entendermos o que é um “adorador paradoxal”?
Aliás, a
Bíblia está repleta de histórias inspiradoras sobre “adoradores paradoxais”,
que do caos e da tragédia, emergiram impávidos em adoração. Paulo e Silas
no cárcere de Felipo (Atos 16:25). Davi na caverna de Adulão (Salmo 23 /
116:1-5). Habacuque confrontando a destruição de Judá (Habacuque 3:17-19). E o
próprio Jesus que na noite de sua prisão, fez questão de orar, e depois, cantar um hino(Marcos 14:26).
Esta mesma experiência pode ser experimentada por cada cristão que se dispuser
a viver a vontade de Deus, em cuja presença, até mesmo a tristeza resulta em
alegria.
Uma das mais
belas canções de todos os tempos se chama IT IS WELL WITH MY SOUL,
que em sua versão na língua portuguesa recebeu o nome de "SOU FELIZ".
Este hino foi escrito em 1873 por um músico presbiteriano chamado Horatio Gates
Spafford. Se a música em si já é belíssima, o contexto de sua composição é
ainda mais inspirador.
Horatio tinha
feito pesados investimentos financeiros em uma área da cidade de Chicago, que
no dia 9 de outubro de 1871, vivenciou um dos maiores incêndios da história dos
EUA. Em decorrência desta tragédia que destruiu cerca de um terço da cidade,
ele teve grande perda financeira. Não bastasse esse terrível abalo financeiro,
Spafford ainda perdeu um filho, cuja morte trouxe grande sofrimento para toda a
família.
Em 1873,
procurando um tempo de refrigério e descanso, resolveu viajar para a Inglaterra
com a esposa Anna e as filhas Annie, Margaret, Bessie, e Tanetta. Lá, a família
participaria de uma grande cruzada evangelística. Em novembro daquele ano,
devido a inesperados compromissos de negócios, Spafford precisou permanecer em
Chicago, mas, embarcou sua esposa e filhas no navio S.S. Ville du Havre,
conforme previamente planejado. Sua expectativa era encontrá-las em Londres
dias depois. Durante a viagem, o navio sofreu um acidente e naufragou em apenas
doze minutos. Dias depois, os sobreviventes finalmente chegaram a Cardiff, no
País de Galles, e a senhora Spafford mandou um telegrama ao seu marido: “SALVA,
PORÉM SÓ”.
Todas as
filhas do casal morreram no acidente. Aquele homem mal tinha superado a morte
de seu filho, e quatro novos funerais ocupariam sua sala. Imediatamente, após
receber o telegrama da esposa, Spafford tomou um navio e foi ao seu encontro.
Próximo ao local do acidente, ele compôs um dos mais belos hinos da história da
música cristã, onde apesar de toda a sua dor e enlutamento, ressaltava que a
presença de Jesus lhe era o bem mais precioso. Na letra, ainda hoje cantada em
igrejas de todo mundo, uma frase revela com precisão o que diferencia o
verdadeiro adorador, dos adoradores de ocasião. Em meio a dor e a tragédia,
Spafford encontrou refrigério em Cristo e pode declarar: - "Tudo
está bem. Tudo está bem com minha alma."
Davi foi
enfático ao afirmar que o Senhor está perto dos que tem um coração quebrantado
(Salmo 34:18). Quando seus corações se despedaçaram, Spafford e Frida
conseguiram transformar a dor que sentiam, em adoração pura e verdadeira.
Quando isto acontece, cada batida do nosso coração é compasso marcando o tempo da música, e nossas lágrimas ao tocar o solo se transformam em notas que reverberam pelo infinito até rompem o céu. E então, Deus se
levanta de seu trono para, emocionado, ouvir a canção .
Paz irmão, estou procurando um poema sobre a vestimenta, que a Frida escreveu, eu vi num site uma vez e nunca mais achei, se possível o irmão me ajudar a procurar, fico agradecida, meu email: decastrod253@gmail.com
ResponderExcluirDébora