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terça-feira, 16 de maio de 2017

Ponto de Vista

O pessimismo é humor; o otimismo é vontade.
(Émile-Auguste Chartier)


Existe uma técnica cinematográfica chamada de “perspectiva forçada”. Sua finalidade é criar uma ilusão de óptica, onde determinado elemento pareça ser maior do que realmente é. Na premiadíssima trilogia “O Senhor dos Anéis”, os pequenos hobbit´s foram interpretados por atores de estatura média convencional, porém, valendo-se de trucagens, ângulos e posicionamento de câmera, o diretor do filme te faz acreditar que as demais personagens em cena possuem o dobro do tamanho. Somos enganados por nossos olhos. Quando olhamos para além do que a lente nos revela, compreendemos que os gigantes não são tão grandes assim.

Israel caiu nesta armadilha. Deixou seus olhos se confundirem com as perspectivas. A promessa era gigantesca, mas, eles a enxergaram pequena. Os cananitas estavam próximos demais, e o povo de Deus se deixou guiar por vistas. Em regra geral, a ausência da fé, restringe nossa visão ao natural.

Quando Israel chegou em Cades-Barnéia, no deserto de Parã, já estava no limiar de Canaã, a poucos passos da terra prometida. Com mão forte e braço estendido, Deus os havia tirado do Egito, e com feitos portentosos, os trazidos até a fronteira da promessa. Mesmo assim, o povo duvidou, temendo o desconhecido, apreensivo com o que estava por vir.

Então, Deus permitiu que Moisés enviasse espias para sondar a terra, e assim, acalmar a ansiedade dos israelitas. Foram escolhidos para esta missão, 12 homens entre os líderes do povo, sendo um de cada tribo: Samua (Rúben), Safate (Simeão), Calebe (Judá), Ioal (Issacar), Josué (Efraim), Palti (Benjamim), Gadiel (Zebulom), Gadi (Manassés), Amiel (Dã), Setur (Aser), Nabi (Naftali) e Geuel (Gade).

Moisés os orientou a colher informações sobre a geografia do lugar (relevos e rios), a qualidade e a produtividade do solo, áreas agrícolas e florestas, aspectos gerais dos moradores, nível de segurança das cidades, e por fim solicitou que fossem colhidas amostras dos frutos ali produzidos. Por quarenta dias os espias sondaram a terra.

Partindo de Cades–Barnéia, chegaram ao sul de Canaã por Hebrom e dali se dirigiram ao extremo norte pelo caminho próximo ao mar Mediterrâneo. Após alcançarem Reobe, o grupo regressou a Hebrom, desta vez pelo Vale do Jordão. Antes de voltarem para o acampamento, os espias se ativeram em Ecol, de onde colheram cachos de uva para apresentarem aos israelitas.

Embora o povo tenha ficado admirado com os frutos trazidos de Canaã, o relatório dos espias não foi recebido com o mesmo entusiasmo. Segundo eles, a terra era realmente boa, manando leite e mel conforme havia sido prometido por Deus. Porém, os habitantes locais eram muito poderosos, as cidades eram grandes e fortificadas, os amalequitas já dominavam a terra do Neguebe, as montanhas eram habitadas por tribos cananitas (heteus, jebuseus e amorreus), e pelo caminho, ainda estavam os filhos de Anaque, homens tão altos, que fariam os israelitas se sentirem como gafanhotos prontos para serem pisados.

Ao ouvirem estas palavras, o povo foi subitamente tomado por grande desanimo, considerando impossível a conquista de território tão hostil, a mesma opinião de dez dos doze espias. Aquela foi uma noite de choro e murmurações.

Josué (da tribo de Efraim) e Calebe (da tribo de Judá) foram as únicas exceções. Eles estavam maravilhados com a terra e nem um pouco preocupados com os inimigos que teriam de enfrentar. Ambos se inflamaram a esforçar o povo, encorajando-os a não terem medo dos cananitas, pois Deus estava ao lado dos hebreus, e os inimigos seriam devorados como se fossem pães (Números 14:9). Porém, os filhos de Israel não deram ouvidos a estas palavras, e imediatamente se levantou grande rebelião contra Moisés e Arão, exigindo um retorno imediato ao Egito, nem que para isso fosse necessário escolher um novo comandante.

Por serem contrários a este desejo retrógrado, Josué e Calebe foram hostilizados pelo povo, e só não foram vitimados por um apedrejamento público, porque Deus bradou com poder e grande fúria na tenda da congregação. 

Falando à Moisés, o Senhor revelou que não tolerava mais a incredulidade daquela gente, os rejeitava como nação eleita, e que o povo seria ferido de morte.

Em decorrência da intercessão de Moisés, Deus não destruiu a nação de Israel em Parã, mas jurou que todos os homens que viram os sinais realizados no Egito, mas, desobedeceram sua voz, não entrariam na terra prometida. A partir daquele dia, Israel peregrinou no deserto por quatro décadas, um ano para cada dia de espionagem. Tempo suficiente para que toda aquela geração morresse e fosse sepultada nas areias. As únicas exceções foram Josué e Calebe.

Josué era filho de Num, eframita nascido no Egito que passou a ter maior destaque nacional quando foi escolhido para comandar os hebreus na batalha de Redifim contra os amalequitas (Êxodo 17:8-16). Seu nome era Oséias (que significa “Salvação), porém, Moisés passou a chamá-lo de Josué (Deus é a Salvação). Durante os anos de caminhada pelo deserto, ele se tornou um tipo de “assessor” de Moisés, acompanhando seu mentor em todos os eventos de relevância. Foi o único autorizado a subir com Moisés ao Sinai quando este recebeu os mandamentos. Também guardava a porta da tenda enquanto Moisés falava com Deus. 

Com a morte de Arão, tornou-se o braço direito do grande líder e seu sucessor imediato. Quando Moisés também morreu, coube a ele a responsabilidade de atravessar o Jordão e conduzir Israel a tomada da terra prometida. Ao todo, Josué liderou a conquista de 33 territórios.

Calebe por sua vez, era um judeu filho de Jefoné que exerceu exímia liderança na tribo de Judá durante duas gerações. Era um homem dotado de muitas virtudes do qual o próprio Deus deu impressionante testemunho. Por sua perseverança e fé, o Senhor lhe fez duas grandes promessas: ele sobreviveria ao deserto e herdaria a terra que espiou (Números 14:34). Ele lavrou este juramento em seu coração, e nem mesmo a passagem dos anos foi capaz de minar sua fé nas promessas.

Depois da morte de Moisés, a voz do Senhor alcança Josué,  e o convoca para conduzir os israelitas a conquista definitiva de Canaã. Deus encoraja Josué dizendo que estaria com ele, da mesma forma que estivera com seu antecessor, e onde quer que chegasse, o sucesso chagaria na frente. Mas, era necessário esforço e motivação, cuidado com a lei, temor e muita coragem. Uma das promessas mais relevantes feitas a este jovem líder, está inserida em Josué 1:4.

– “Desde o deserto e desde este Líbano até ao grande rio, o rio Eufrates, toda a terra dos heteus e até o grande mar para o poente do sol será o vosso termo.

Esta promessa de sucesso e vitórias estava claramente atrelada com a capacidade visionária do novo líder, pois o Senhor determinou que o limite para as conquistas de Josué (termo), seria o poente do sol. Aqui temos um mistério interessante, pois o sol não se põe em um local geográfico específico, mas sim atrás da linha do horizonte.

A definição para “horizonte” é basicamente um plano que passa pelo observador e é perpendicular à direção do fio de um prumo. Resumindo: A linha do horizonte começa, onde termina o alcance da visão. Portanto, o “poente do sol” é relativo, variando de pessoa para pessoa.

Assim, podemos entender que Deus estabeleceu uma aliança com Josué, determinando que seu território seria exatamente do tamanho de sua visão. Um homem de visão limitada, restringe o potencial de suas próprias conquistas. 

Quando Deus nos escolhe, Ele também aponta a direção que devemos olhar, mas não estabelece limites práticos, pois é exatamente o alcance da nossa visão que determina o território a ser conquistado. É tudo uma questão de ponto de vista.

Quando os espias retornaram com seu relatório, dez deles estavam aterrorizados com o tamanho dos filhos de Anaque, verdadeiros “gigantes” que faziam homens comuns se sentirem como insetos. Josué e Calebe, por outro lado, olhavam a situação sob outra perspectiva. Eles se focavam nas uvas.

Historicamente os hebreus sempre foram apreciadores de um bom vinho, e isso demandava o cultivo de vinhedos de boa qualidade. Assim, enquanto os espias só conseguiam enxergar o problema, analisando como eram fortes e poderosos os habitantes da terra, Josué e Calebe se atentaram ao fato que eram necessários “dois” daqueles homens para carregar um único cacho de uva produzido na região.

Muitas vezes, problema e solução são faces distintas do mesmo prisma, e assim, a interpretação do custo-benefício depende de “quem” e “como” se olha para ele.

Conta-se que o dono de uma loja de sapatos enviou dois de seus vendedores para uma cidade do interior. Um deles, ao chegar, verificou que os moradores andavam descalços. Imediatamente voltou para casa, imaginando que ninguém se interessaria em comprar sapatos por ali. O outro vendedor, ao constatar a mesma situação, abriu um sorriso largo e falou consigo mesmo:

- Ninguém nesta cidade tem sapatos.... Vou vender que nem água!

Josué e Calebe enxergaram oportunidades onde outros viam impossibilidades.  Ao olhar apenas para os fatos e as evidências humanas, toda uma nação foi corroída pela descrença. Os dois, porém, mantiveram seus olhos voltados para Deus, focados na promessa, certos que o “EU SOU” não abandonaria sua grande obra pela metade.

Sob a liderança visionária de Josué, os israelitas reconquistaram as terras de seus patriarcas, vencendo muitas batalhas na força do Senhor. Um dos líderes mais expoentes deste avanço em Canaã foi exatamente Calebe, que liderando uma tribo formada por 76.500 judeus, ocupou boa parte da região sul de Canaã, tomando posse dos territórios que formaram a Judeia.

Após cinco anos de campanhas, Calebe viveu plenamente a promessa, quando finalmente recebeu por herança o monte Hebrom. Antes, porém, precisou realizar uma limpeza territorial, expulsando da região tribos hostis e povos pagãos, sendo que entre eles estavam os anaquins Sesaí, Aimã e Talmai, os mesmos gigantes que causaram tanto pavor nos dez espias que foram sepultados no deserto.

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