Você não conhece uma pessoa enquanto não tiver
comido com ele um pacote inteiro de sal
(Provérbio Russo)
O
sal é maravilhoso. Encontrado em praticamente todas as cozinhas do planeta, ele
nada mais é que cristais formados por sódio e cloro, deixados na areia quando a
água do mar evapora. Mais de três por cento de nossos oceanos são compostos por
sal. E não para por aí. No organismo humano, o sal é responsável por regular a
quantidade de líquidos que devem ficar dentro (e fora) das células. Uma
atribuição vital. Na
dosagem correta, o sal é um grande aliado na boa digestão. Para quem gosta de
praticar atividades físicas, a ingestão moderada de sal, ajuda na reposição do
sódio perdido na transpiração, mantendo um equilíbrio saudável de água e
nutrientes no organismo. Como já ponderou o pensador libanês Khalil Gibran, “deve existir algo estranhamente sagrado no sal,
já que ele é abundante no mar, e está presente em nossas lágrimas também”.
Mas,
não se empolgue na salinidade. O sal é uma faca de dois gumes. Se almoçar um
prato insosso é desagradável, jantar um escondidinho salgado pode ser uma
experiência ainda pior. A palavra chave para o uso inteligente do sal é exatamente
“equilíbrio”. A ausência, fragiliza. O excesso, mata.
Não
foi por acaso, que Jesus usou esta metáfora, para elucidar aos seus discípulos,
sobre nosso papel como agentes influenciadores no mundo:
- Vocês são o sal da terra. Mas se
o sal perder o seu sabor, como restaurá-lo? Não servirá para nada, exceto para
ser jogado fora e pisado pelos homens. (Mateus 5:13)
Que
responsabilidade a nossa. O mundo perdeu o sabor. Tudo é insípido. Cores
artificiais. Monumentos de papelão. Desde o Éden, pouco a pouco, a humanidade
tem perdido o seu paladar espiritual, num fenômeno crescente chamado
“apostasia”. É exatamente por causa desta tendência mundana, que Jesus se
mostrou apreensivo com o futuro: - Quando
o Filho do homem vier, encontrará fé na terra? " (Lucas 18:8).
A
Igreja de Cristo (não a sua denominação,
e muito menos a minha), é o antídoto aplicado por Deus neste planeta, afim
de protegê-lo do completo caos. Somos o sal, fazendo a diferença num mundo
indiferente, trazendo equilíbrio a um corpo desequilibrado, e a beira do
colapso total. Sal na medida certa, evitando que a carne apodreça. Agindo sobre
o gelo, para que ele derreta antes da hipotermia. Numa época onde o paladar
humano está averso ao banquete celestial, temos a árdua tarefa de trazer sabor
a uma geração insossa, que se autodenomina “quente”, mas que na verdade é morna.
Apática.
Jesus
foi categórico no recado. É preciso ter muita cautela para não se conformar com
o contexto profano no qual estamos inseridos. – Não percam o sabor! Tire o salgado do sal, e contabilize o prejuízo. Para que ele serviria? Quem se interessaria por ele? Cristo assegurou que o sal
sem sabor, nada mais é que pedras calçando a estrada. Só serve para ser pisado.
Conteúdo destinado ao lixo.
Infelizmente,
parte dos cristãos não entendem o conceito de equilíbrio. Não conseguem se
enquadrar numa dosagem correta. Enquanto muitos temperam sua vida com a mesma
quantidade de sal prescrita nas receitas de uma sopa hospitalar, outros tantos
nadam de braçada nas águas insalubres do Mar Morto. Ambos estão fora de contexto.
O insosso perdeu a essência. O salgado não entendeu o propósito. E parafraseando
o pensamento cirúrgico de Cristo, “para
que ambos servem”?
Se
a ausência de sabor é um sintoma inegável de esfriamento espiritual letárgico,
o excesso de sal não indica hiper espiritualidade. Ser salgado não é ser santo.
Os extremos são sempre perigosos. Se a presença de Deus é um oceano, uma
imensidão de águas contendo baixíssimas porcentagens de sal, que sentido existe
numa vida mais salgada que um pudim a base de cloreto de sódio? Cadê o domínio
próprio? Onde fica a frutificação espiritual?
A
salinidade da vida cristã também é um sintoma. Um alerta aos excessos. Ao
achismo. Ao egocentrismo. Gente que se acha demais. Se sente demais. Santidade
autodeclarada. Independência proclamada. Autossuficiência assumida. Homens e
mulheres que se julgam tão cheios de Deus, que acabam corroídos por este
sentimento de superioridade. A salinidade excessiva acelera a oxidação. A
ferragem espiritual nos torna insensíveis. Ninguém mais importa. Nenhum
professor é bom o suficiente para ensinar algo que já não se saiba. E esta
sensação de estar com vida zerada é tão perniciosa quanto uma vida vazia de
Deus.
Quem
muito retem e nada libera, mata de sede as pessoas que o cerca, e morre vítima
de overdose por sal. Afogado em pretensões. Não podemos simplesmente assentar
sobre a barragem, sem se quer, molhar os pés na represa. Porém, não é sábio
mergulhar em águas represadas. É preciso deixar o fluxo seguir.
A vida dentro do Mar Morto é inviável. Seu nome extravagante se dá
exatamente porque nada sobrevive muito tempo ali. Isso acontece em decorrência
do grande teor de sal em suas águas, e este fenômeno, tem uma explicação muito
interessante.
O Mar Morto recebe águas cheias de vida, sendo que até mesmo o famoso
Rio Jordão deságua nele. Porém, quando estas mesmas águas adentram o mar, a
vida é sumariamente inutilizada. O problema, é que embora receba muito, o Mar
Morto não reparte o que tem. Uma vez nele, a única saída possível de águas e
pela evaporação, e com isso, o sal se acumula em sua bacia, elevando o nível salino
absurdamente. Nenhum peixe consegue sobreviver.
Assim também somos nós. Recebemos de Deus toda sorte de bênçãos,
revelações e muito amor, mas, se não dermos vazão a este manancial do Senhor,
nos tornamos mesquinhos como o Mar Morto, retendo o que é bom, e sufocando tudo
a nossa volta com o sal acumulado, que se manifesta em críticas maliciosas,
julgamentos unilaterais e muita autoafirmação hedonista. Quem vive apenas para
si, tende a matar quem se aproxima dele, e com isso, acaba morrendo na solidão.
A nobreza do ser humano não é medida pela quantidade de pessoas que o
servem, mas sim na qualidade das pessoas que ele consegue servir. O Salmo 134:1
identifica o caráter dos homens que Deus procura: - Bendize ao
Senhor vós todos os seus “servos”, louvai o nome do Senhor. Entrega. Serviço. Generosidade.
Em vez de sermos salgados por retermos de forma egoísta o que recebemos, que
sejamos servos generosos para com o Senhor e aos homens, pois caso contrário
podemos sucumbir ao saturamento, e inibir que novas bênçãos nos alcancem.
Saber
dosar. Salgar sem agredir. Temperar sem errar a mão. Repartir com liberalidade
ás águas que fluem do Espírito, formando uma fonte em nosso interior.
Fonte,
não lago.
Jorrar,
não reter.
Quem
reprime para si toda a abundância que recebe, se afoga em águas que deveriam
salvar. A salmoura se torna amarga. Gosto de morte. Hipertensão na alma.
Envelhecimento espiritual. Pedras no coração. Descontrole. O excesso de sal
matando a doçura dos frutos.
Mas o fruto do Espírito é amor,
alegria, paz, paciência, amabilidade, bondade, fidelidade, mansidão e domínio próprio. (Gálatas 5:22-23)
Quer
um exemplo de sal ministrado com exatidão? Leia os evangelhos. A mesma mão que
empunhava um chicote contra os agiotas da fé no templo, acarinhava com ternura
os cabelos de uma criancinha. A mesma voz que bradava vigorosa contra o pecado,
gentilmente oferecia perdão e paz ao pecador. Tudo na dose exata.
Mateus
5 é um texto memorável. Uma cartilha de aprendizado para todos aqueles que
querem fazer a diferença no mundo. A abolição da justiça própria. A negação dos desejos. A pratica da
generosidade para com os inimigos. A bandeira do amor ao próximo tremulando sobre
as instituições. Jesus apontava para seus discípulos um caminho novo e muito
difícil de trilhar. Poucos estavam dispostos. Muita resignação. Sacrifícios
diários. Quebra de paradigmas. Mudança de pensamento.
O
mundo não era assim. E continua não sendo. É neste cenário (atual nos dias de hoje como foram nos dias de Jesus) que o Mestre
nos incumbe de fazer a diferença. Inspirar a mudança. Alavancar a
transformação. - Vocês são o sal dando sabor a um mundo sem gosto. São luz num
ambiente de escuridão.
Sozinho,
o sal não sustenta ninguém, e sequer, pode matar a fome de uma pessoa. Ele
apenas ressalta o que outros alimentos têm a oferecer. Então, que sejamos o
“sal” presente no “Pão da Vida”, assado lentamente na cruz e servido aos homens.
Este sim, capaz de matar a fome da alma. Que sejamos o sal presente no oceano
da graça, capaz de matar a sede espiritual da humanidade. Nossa maior virtude é
se manter em Cristo. Permanecer em Deus. Fora dele, só nos resta se fundir ao
solo, e ali, desaparecer.
Então, apareça. Seja o sal. Seja a luz. Seja o ponto de equilíbrio de uma sociedade caótica que caminha embriagada sobre cordas bambas. E, em todo tempo, também se mantenha equilibrado. Sóbrio. Mãos firmes durante a dosagem. Que através de você (que é “sal”), o paladar da humanidade se apure, e sinta o gosto adocicado da salvação.
Então, apareça. Seja o sal. Seja a luz. Seja o ponto de equilíbrio de uma sociedade caótica que caminha embriagada sobre cordas bambas. E, em todo tempo, também se mantenha equilibrado. Sóbrio. Mãos firmes durante a dosagem. Que através de você (que é “sal”), o paladar da humanidade se apure, e sinta o gosto adocicado da salvação.
Nenhum comentário:
Postar um comentário