(Martinho Lutero)
O patriarca
Jó teve com Deus um dos mais longos embates ideológicos de toda a Bíblia. Ele
considerava injusta as severas punições que lhe tinham sido imputadas. Deus, em
contrapartida, lhe fez entender que havia um proposito em cada segundo de seu
sofrimento. Ao final da conversa, Jó reconheceu a superioridade de Deus, e
humildemente aceitou os argumentos divinos como superiores a qualquer
pensamento humano.
Porém, o
patriarca ressaltou que aquela era uma conversa injustiça, pois a grandeza de
Deus em contraste com a pequenez do homem, o colocava na posição de uma gota
diante do oceano. Então, “sugeriu” que deveria existir um “intermediador”. Alguém
que compreendesse plenamente a essência de Deus, mas, que também conhecesse as
agruras de "ser homem", e pudesse conversar nas duas esferas com a
mesma propriedade (Jó 33:23). Mesmo sem saber, Jó estava descrevendo as
atribuições de Cristo, confirmadas em I João 2:1.
Deus criou o
homem, e o conhece de forma profunda e irrestrita. Sabe suas deficiências e
fragilidades, bem como o potencial a ser desenvolvido. Sonda seu coração,
escuta os seus pensamentos e conta os seus dias. Deus escreveu o manual de
funcionamento do homem, mas na prática, nunca “foi homem”. Deus nunca sentiu
frio, fome, medo, ansiedade, angústia, dúvidas ou tristezas permanentes. E o
mais importante: Deus não pode ser tentado.
Assim, Deus
falava “com” o homem, mas, nunca “como” o homem. Esta aparente “distância” foi
eliminada através de Cristo. O “VERBO” se fez “CARNE” e habitou entre nós (João
1:1). Jesus era o próprio Deus encarnado, vivendo entre os homens, composto de
corpo, alma e espírito, sentindo na pele todas as debilidades da humanidade, sendo
desafiado em todas as esferas da existência humana. Deus estava se pondo a
prova, sujeito a todas as paixões e as tentações que enfrentamos diariamente. E
como homem (não como Deus), resistiu a cada uma delas.
É
interessante notar que em sua forma humana, Jesus foi um alvo prioritário de
Satanás, assim como hoje, somos também. Satanás é um adversário sútil,
perspicaz e ardiloso, que embora não deva ser “temido”, jamais pode ser
desmerecido, subestimado ou enfrentado sem a estratégia adequada, pois caso
contrário, tem a assustadora capacidade de “cirandar” com a alma do homem
(Lucas 21:31).
E
aparentemente, Jesus estava vulnerável. Uma pombinha indefesa diante da astuta
serpente. Após ser batizado no Jordão, Cristo se retirou para um período sabático
no deserto. Pelos próximos quarenta dias, ele se privaria de pão, enquanto
buscava no Pai, as forças necessárias para seu ministério meteórico e
intensivo. Debilitado e faminto, Jesus estava para Satanás, como uma mosca
presa na teia. E a aranha infernal esperou o momento certo do ataque.
Primeiro,
ele se aproveitou da fome intensificada pelo período de jejum para tentar
convencer Jesus a transformar “pedra em pão”. Se cedesse, Jesus estaria agindo
fora do tempo estabelecido para seu ministério, e valendo-se da condição divina
para beneficiar sua forma humana, fugindo completamente do propósito de sua
missão.
Em seguida,
Satanás propôs um desafio de “vida ou morte”, tentando inflar o “ego” de
Cristo. A intenção era fazer Jesus banalizar sua humanidade, simplesmente para
provar que tinha autoridade sobre os anjos, agindo em nome de mera vaidade.
Por último,
o inimigo ofereceu a Jesus os governos humanos em troca de adoração. Com isso,
Satanás esperava fragilizar o espírito de Cristo e corromper sua adoração.
Jesus não cedeu a nenhuma delas.
Jesus se
manteve de pé no ponto exato onde o homem caiu: Diante do dilema moral e espiritual de uma tentação. Enquanto o
homem foi derrotado no Jardim, cercado de provisões e maravilhas, Jesus
triunfou vitorioso no deserto, ladeado por escassez e privações.
A grande
verdade é que Jesus acumulou diversas vitórias sobre Satanás. Na cruz Ele o
derrotou com Sangue. No céu e no inferno, a vitória veio através de seu Poder.
Nada, porém, é mais emblemático que a Vitória no Deserto, pois a arma utilizada
foi à mesma que temos em nossa mão hoje. Obediência a Palavra de Deus.
Se Ele (em
forma de homem) venceu, podemos vencer também. E fortalecidos por esta
jurisprudência, temos também, um alvo a atingir.
Vale lembrar que embora
Satanás tenha tentado Jesus, não foi ele quem o levou para o deserto. Segundo
Mateus, o Espírito Santo conduziu Cristo até o deserto, exatamente para que
Jesus fosse tentado em tudo. Deus desejava experimentar na condição humana as
tentações enfrentadas por nós todos os dias. E Ele venceu todas elas, nos
provando que é possível sim, dizer não ao diabo e suas ofertas.
Não podemos
perder o foco de nossa missão. O que precisamos com urgência é recuperar nossa
compreensão de que Deus tem propósito quando nos leva ao deserto, e aceitar sua
vontade. Infelizmente hoje muitos crentes têm tentado fugir de seus desafios
desérticos, e pensam que por mero conhecimento teórico, ou pelo tempo de crença
e serviço religioso, já podem galgar altos escalonados ministeriais, ou atingir
elevado nível de espiritualidade. Ledo engano.
Existem
lições que só aprendemos na prática, e o deserto sempre será o lugar de Deus
nos experimentar, testar nossas habilidades, conhecimentos e intenções de nosso
coração. Deus não pretende mudar sua forma original de tratar com seus filhos.
O lugar para se levantar da queda no Jardim é o Deserto.
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