Arquivo do blog

quinta-feira, 19 de julho de 2018

Trocam-se lágrimas por sorrisos


As lágrimas são o supremo sorriso.
(Stendhal)


Um dia a lágrima disse ao sorriso: - Invejo-te porque vives sempre feliz. O sorriso respondeu: - Engana-te, pois muitas vezes sou apenas o disfarce da tua dor. Não sei exatamente quem escreveu este dialogo, mas certamente entendo o que cada palavra representa. Tristezas e alegrias se alternam com tamanha frequência, que por vezes, ficamos confusos sobre qual é o sentimento dominante em momentos decisivos da vida. E perdidos nesta dicotomia emocional, tentamos encontrar embasamento palpável para aquilo que apenas se sente. E neste ponto, tudo parece ser "oito" ou "oitenta". Apenas confrontos internos ao invés de uma sinergia entre os sentimentos. Dizem que é preferível fingir um sorriso do que derramar uma lágrima verdadeira. Não é. Ambos (sorrisos e lágrimas) possuem beleza semelhante, e quando plantados (enxertados) no solo correto, geram frutos de sabor adocicado. Se sorrir faz bem, chorar não causa mal. Basta encontrar o ponto de equilíbrio, e não viver de extremos. A vida jamais pode ser pautada apenas em lágrimas ressentidas ou sorrisos inconsequentes. Chorar ou sorrir nos momentos oportunos mantém a mente longe da insanidade.  

Sempre que me encontro em meio a uma escassez de sorrisos, ponho-me a recordar de todos os motivos que já tive para chorar. E por mais paradoxal que possa parecer, o riso não demora a chegar. Duvida? Pois faça este mesmo exercício de memória. Lembre-se de suas lágrimas mais ressentidas e dos motivos por trás de cada uma delas. A causa de alguns de nossos maiores sofrimentos em dias passados, pode muito bem ser fonte de inspiração para boas gargalhadas ainda hoje. Ou, talvez, apenas o gatilho para aquele sorrisinho acanhado que somente quem lembrou, mas preferia esquecer, consegue identificar. Pouco importa. Se por um instante o bom humor acenar na janela, acene de volta e o convide a entrar. É maravilhoso receber a felicidade como hóspede.

Não estou dizendo que chorar é ruim, e nem que lágrimas devem ser banalizadas. Longe disto. Quero apenas te lembrar que nenhuma tristeza dura para sempre. Enlutamentos não são eternos. Dores crônicas (no coração e na alma) podem ser erradicadas (ou atenuadas) com o uso correto de um analgésico chamado “TEMPO”. E mesmo que pareça improvável, lágrimas podem ser trocadas por sorrisos verdadeiros, desde que os ciclos sejam respeitados. Para cada noite de tristeza, sempre haverá uma manhã de alegria. Elas se completam. Forjam nossa essência. Moldam o caráter, como se fossem a maré esculpindo a encosta de uma ilha.

Lágrimas nos levam a reflexão. Sensibiliza a audição humana no que tange a voz de Deus. Liquefaz o coração. E talvez este dilaceração emocional seja o primeiro passo para a reconstrução de uma alma em cacarecos. É melhor um sorriso fingido do que lágrimas verdadeiras? Quanto engano. O choro pavimenta a estrada dos mais emblemáticos recomeços. A dor é uma chave mestra abrindo portas que sequer sabíamos existir. 

Deus interpreta nossas lágrimas, e com isso entende a intensidade de nossa dor. Lágrimas são frases para Deus. Quando não temos mais forças para orar e só conseguimos chorar aos pés do Senhor, Ele não só ouve o nosso clamor sem palavras, como também recolhe todas as nossas lágrimas em seu precioso tesouro. Mas, por ser fiel ao nosso livre arbítrio, o Senhor só recolhe para si, as lágrimas que lhe entregamos voluntariamente. Então, a grande questão é: -  Para quem temos chorado? 

Em II Reis 4, encontramos a história de uma mulher lidando com a morte do próprio filho, e que pode nos ensinar algumas lições sobre o choro produtivo.

O profeta Elizeu fazia questão de caminhar pelas ruas de Suném durante suas peregrinações até o Carmelo.  Esta rotina anual, não passou despercebida por uma das moradoras locais. Percebendo que o profeta tinha o hábito de passar próxima a sua casa e reconhecendo que ele era de fato um homem santo; essa hospitaleira sunamita, cuja identidade sequer foi revelada, convidou ao profeta para realizar refeições regulares em sua casa. Não sendo isto o bastante, ela convenceu seu marido a construir um cômodo extra no segundo andar, próximo ao muro da residência, para que Elizeu pudesse se hospedar com conforto e privacidade. O profeta do Senhor, consternado com tamanha hospitalidade, sentiu a necessidade de retribuir o favor. A mulher era estéril e nada melhor que um filho para alegrar a casa, então ela recebeu de Elizeu a seguinte promessa: - No próximo ano, nesta mesma data, terás um filho em seus braços. 

Sua palavra foi tão poderosa que naquela mesma noite o marido se tornou fértil, e a mulher foi curada de sua esterilidade. Porém, passados alguns anos, de forma repentina, o menino teve uma dor de cabeça muito forte. Ela tomou a criança em seus braços, e passou as horas seguintes clamando ao Senhor pela cura de seu filhinho. Aquela mulher, certamente não contava com o óbito da criança, pois tinha certeza que Deus não tiraria o presente que lhe fora dado, sem ao menos que ela tivesse pedido. Mas, a tragédia inesperada bateu em sua porta. Por volta do meio dia, o menino faleceu e com ele as esperanças de cura. Porém, a sunamita não desistiu. Se a cura não era mais possível, que o impossível acontecesse. Se a enfermidade venceu, a morte teria que ser derrotada. E ela iria até as últimas consequências.

Sem alarmar ao marido, a mulher levou seu filho já sem vida até o quarto construído para o profeta (subindo escadas). Enxugou o seu choro, e disse ao esposo para não se preocupar, pois “tudo estava tudo bem”. Depois, caminhou confiadamente por cinco quilômetros até o Monte Carmelo, onde o profeta realizava suas orações. Ao vê-la se aproximando, o profeta percebeu sua aflição de espírito, mas não recebeu de Deus a revelação do ocorrido. Elizeu ordenou que Geazi fosse ao seu encontro e a indagasse sobre como estariam os membros de sua família.  - Como vai você? Como vai seu marido? Como vai seu filho? E as respostas ainda dadas por ela, ainda soam surpreendentes. -  Bem... muito bem... Vai tudo muito bem!

Aquela mulher entendeu a necessidade de ser forte, e manter inabalada a sua fé, certa de que nada estava perdido, e que se Deus lhe havia dado um filho, nem mesmo a morte poderia tirá-lo dela. Com esta crença, se manteve inabalável por fora, ainda que estivesse aflita em seu interior. A sunamita não perdeu tempo com reclamações, indagações e questionamentos. Tampouco gastou suas lágrimas com inutilidades ou lamúrias com quem nada poderia fazer por ela. Mas, diante do profeta, representante de Deus na terra, a mulher descortinou seu coração e as lágrimas rolaram em sua face.

Ela chorou pra Deus. Ao tocar o chão empoeirado de Suném, suas lágrimas provocaram tremores nos céus. O Senhor recolheu cada gota salgada num frasco dourado. E efeito deste choro produtivo? ALEGRIA! Ela recebeu seu filho de volta para vida. O odre celestial transformou lágrimas em milagre!

Deus não se contenta em apenas recolher nossas lágrimas. Ele as transforma em sementes produtoras de sorrisos. A nossa vida é um ciclo constante de longas noites de choro, seguidas de manhãs de imensa felicidade. Significa que estamos vivos, que nosso coração pulsa, que nossa alma sente e que nosso espírito ainda clama por Deus. O choro é uma estrada que nos leva de volta ao Senhor. Basta querer caminhar nela. A jornada pode não ser fácil, mas, nos torna mais fortes.

E quer saber? O real valor de um sorriso é medido exatamente pela quantidade de lágrimas derramadas antes dele. Só assim temos parâmetro. Então, chore. Sem receio, mas com responsabilidade. Não tempere suas lágrimas com pitadas de ódio. Apenas deixe-as rolar, enquanto lavam a alma e o coração. Que cada momento de tristeza seja um sacrífico apresentado diante do Altar do Senhor! Deus nos dá força e esperança para transformar lamentos em cânticos, e motivos para deixar em casa os "trapos da tristeza", e sair pelas ruas trajando vestes ! Cada lágrima, vale um sorriso (Salmo 30:11).

Nenhum comentário:

Postar um comentário